Escola indígena: partilhando saberes e culturas das etnias cearenses

18 de abril de 2016 - 10:15

Numa manhã chuvosa, sentada em uma das salas de aula da escola que viu ser construída, uma senhora indígena de cinquenta e poucos anos recorda a história que a motivou a buscar uma educação de qualidade para o seu povo. “Quando não existia essa estrutura aqui, os alunos iam para uma escola, junto com os brancos. Ia todo mundo misturado no transporte, sem diferenças. Aí um dia, um garoto jogou uma pedra em uma menina índia, por puro preconceito, afirmando que ali não era o lugar do nosso povo. A garota tinha quatorze anos, ficou com a visão do olho prejudicada até hoje”, relata.

Quem relembra o fato é Erbene Rosa Veríssimo, uma das lideranças mais importantes da aldeia Munguba, localizada em Buriti, distrito do município de Itapipoca, no Ceará. Muito orgulhosa da sua etnia, Tremembé, Erbene é também professora de Biologia e destaca como missão da sua vida a disseminação do conhecimento e a busca por um futuro melhor para seu povo. Com olhar sempre atento e observador, ela demonstra confiança nas transformações que a educação vem realizando na vida da aldeia, principalmente, por perceber que a sua comunidade poderá repassar às novas gerações, as crenças e o conhecimento de seus antepassados.

Sensibilizada pelo episódio envolvendo a criança apedrejada, Erbene procurou maneiras de conseguir uma escola para a sua comunidade e entrou em contato com a Secretaria da Educação do Estado do Ceará (Seduc). Assim, a Escola Indígena Diferenciada de Ensino Fundamental e Médio de Buriti – Brolhos da Terra foi inaugurada em 3 de setembro de 2010.

Erbene

A professora conta que a inauguração foi numa sexta e, na segunda-feira, se sentiu orgulhosa ao ver a escola já lotada de estudantes. “Eu me sinto feliz por fazer parte dessa conquista, de poder repassar para as nossas crianças a história do nosso povo, valorizar a cultura, não deixar nada se perder. E estamos conseguindo fazer isso através da educação, que é uma coisa muito valiosa, pois é uma forma da gente se reconhecer e ter orgulho de ser índio, além de dar continuidade à nossa história de luta”.

Os antepassados do povo Tremembé desta região, segundo Erbene, escondiam muito a sua condição de índio, por medo do preconceito, mas as gerações seguintes foram quebrando um pouco este pensamento. “Os jovens, que estudam nessa escola, ou mesmo os que já se formaram, têm orgulho de assumir a sua etnia, a sua origem indígena, e usam as nossas vestes ou acessórios, tanto para andar pela aldeia, como fora dela. Nos sentimos livres e orgulhosos por ser índio”, conta, animada. 

A comunidade e a escola vivem em harmonia, os mais velhos e sábios da aldeia sempre recebem convites para participar das disciplinas voltadas para a cultura e a história do povo Tremembé. Da mesma forma, os alunos visitam a aldeia para realizar pesquisas, como por exemplo, na aula de Erbene, quando ela apresenta as diferentes sementes que brotam na sua região e os estudantes vão à comunidade ouvir as explicações dos mais velhos e conhecer mais sobre a terra.

 

 MG 9351

 

Erbene destaca a importância do povo como alicerce para uma escola indígena. “A gente sempre convida e todos participam das atividades da escola. Se eu morresse amanhã, iria sabendo que deixei muitas coisas. E que as novas gerações não vão esconder e nem esquecer o orgulho que é ser índio”, ressalta. 

Ao longo do tempo, Erbene sempre buscou ampliar os estudos, com o pensamento de que todo o conhecimento que conquistasse, poderia ser levado para seus alunos e para a sua aldeia. Hoje, a professora indígena possui graduação em Biologia e Pedagogia e pós-graduação em Gestão Escolar. Cursou cinco anos de Magistério Indígena, uma formação oferecida pela Seduc, e está participando, atualmente, do curso de Licenciatura Intercultural Indígena, ofertado pela Universidade Federal do Ceará (UFC).

 MG 9343

 

Educação indígena na Rede Estadual de Ensino

Os povos indígenas têm direito a uma educação escolar específica, diferenciada e intercultural. A Educação Escolar indígena é uma modalidade da educação básica que visa à recuperação de memórias históricas, reafirmação de identidades étnicas, valorização de línguas e ciências dos índios, além de garantir acesso às informações, conhecimentos técnicos e científicos da sociedade nacional e demais sociedades indígenas. No Ceará, o processo de constituição das escolas indígenas começou no final da década de 1990, com a luta das diferentes etnias. 

A Secretaria da Educação do Estado do Ceará (Seduc), por meio da Coordenadoria da Diversidade e Inclusão Educacional, desenvolve ações de apoio à implementação da educação escolar indígena, contribuindo para a afirmação dos povos do Ceará como sujeitos de direito. Do direito à escola, à aprendizagem, aos conhecimentos universais e àqueles que fortaleçam as suas identidades étnicas e de sua pluralidade cultural. 

A rede de escolas indígenas conta com 37 unidades estaduais, pertencentes a 13 etnias, distribuídas em 15 municípios. Em 2016, essas escolas possuem 6.179 alunos matriculados, ofertando da educação infantil ao ensino médio regular e a modalidade de educação de jovens e adultos (EJA).

 

 

CREDE/Municípios

ETNIAS

NÚMERO DE ESCOLAS INDÍGENAS

Crede 01 – Aquiraz, Caucaia, Maracanaú, Pacatuba

Anacé, Tapeba, Pitaguary, Jenipapo Kanindé

14

Crede 02 – Itapipoca

Tremembé

1

Crede 03 – Acaraú

Tremembé

9

Crede 05 – São Benedito

Tapuia Kariri

1

Crede 07 – Canindé

Kanindé

1

Crede 08 – Aratuba

Kanindé

1

Crede 13 – Crateús, Monsenhor Tabosa, Novo Oriente, Poranga, Tamboril

Potiguara, Tabajara, Kalabaça, Tubiba Tapuia, Kariri, Tupinambá

9

Crede 15 – Quiterianópolis

Tabajara

1

 

 

15.04.2016

Assessoria de Comunicação da Seduc

imprensa@seduc.ce.gov.br